Roberto servia numa florista em Odivelas. Os clientes que por ali passavam chamavam-lhe bicha em surdina. Tinha tremores à noite quando pensava no sofrimento atroz que isso lhe causava. Arrebitava às orelhas sempre à cata do menor comentário. Zurziam as velhas por entre os ramos, as crisálidas e os crisântemos, prontas para lhe ferroar com esse nome nojento que ele conhecia só pela entoação palatal. Subia-lhe uma verve negra pelo pescoço, prestes a vociferar uma resposta lagarta de tão peçonhenta, mas segurava o ventre para não verter aquela mostarda infecta em cima das mulheres. A troça era constante, num vaivém militaresco de reformadas com cachuchos nos dedos, empertigadas por se acharem flausinas, capazes de nem com os pés tocarem na terra. Deolinda, uma delas, atazanava-lhe o juízo com pedidos dignos de uma cocote parisiense. Só lhe faltava exigir um caffé crema para levar em pandã com os lírios enjaulados no papel. Ó! Se pudesse abria-lhe a cachola com o regador de inox e deitava lá dentro o ódio venéreo que por ela sentia. Nunca ali encontrou paz Roberto.